terça-feira, 16 de julho de 2013

As moedas



Na década de oitenta,No sitio São Luiz as  moedas serviram
de "fichas" para a contagem de balaios de café apanhados na época da colheita. Ao
final de um dia de trabalho, cada apanhador, normalmente mulheres, recebia as fichas correspondentes aos
balaios de café apanhados naquele dia - um uso já bem diverso da concepção original das moedas pelo
velho Manoel. Ao final da semana era feito o pagamento do café apanhado pela contagem das fichas, ou
seja, das moedas. Aqui no São Luis estas moedas serviram ao meu avô Dr. Luís, ao meu pai Onofre e a mim
Francisco Luiz, três gerações. Curioso também é observar que neste novo mister as moedas eram usadas
indistintamente como fichas. Ficaram sujas e gastas com o passar do tempo e também não se fazia diferença entre os valores deface década moeda.

           O topônimo Guaramiranga vem do Tupi. Guará (vermelho) miranga ou piranga (garça),significando Pássaro Vermelho sua denominação original era Conceição desde 1890.As terras da atual Guramiranga era habitada por várias etnias sendo a principal os kanindé. Com a criação da Missão da Palma durante século XVIII, para evangelização dos Siviculas.A expansão da pecuárias e as plantações de café no século XIX consolidou-se o centro urbano que hoje se chama Guaramiranga.

 
Centro de Guramiranga em 1828

quarta-feira, 10 de julho de 2013

Memórias

Imagem atual da Igreja Matriz de Guaramiranga

Construída na seca de 1877  a 1880

Senhor do café e das moedas de Guaramiranga

O coronel Figueiredo 

           Nesta serra em transição laborava o coronel Manoel José d´Oliveira Figueiredo — o homem das moedas.
Vivia na Fazenda Bom Sucesso, em Guaramiranga. Português misto de agricultor e comerciante,  com certeza um empreendedor. Pai de muitos filhos, possuidor de algum dinheiro, dono de muitas terras, protagonista de muitas histórias.
                 Como agricultor tinha propriedades em Baturité, em Uruburetama, nos sertões do Quixadá e do Canindé, era do plantar e do criar. A cada fazenda, lavouras distintas, interesses vários, leitos diversos...
Como comerciante, informa-me o Prof. Vinícius Barros Leal, o verdadeiro conhecedor da história da serra, que o registro número um da junta comercial do Estado do Ceará é uma firma de torrar café na Guaramiranga de sua inspiração. Se juntarmos essa ousadia com a concepção destas moedas, não acredito em ninguém mais arrojado.
              Deve ter, dentro do trabalho, usufruído do melhor da serra e do seu tempo... E era um jogador.
E a vida muda o jogo. Voltemos àqueles cafezais constituídos com fogo, naquelas escarpas íngremes de solo muito raso, a mercê da erosão, eles não tinham vida longa; morriam. A prática de sombreamento do cafezal com a ingazeira ainda não era uma técnica generalizada. Todavia, ali nascia a maniçoba, um negócio novo, borracha na serra! O nosso coronel, com sua operosidade, investe preferencialmente nessa nova atividade, até comprando novas terras, redobrando seu trabalho. Contraindo dívidas e canalizando seu capital para a nova atividade enfrenta os novos tempos e se impõe o empreendedor. E o jogo muda a vida.
Pensando no café, para dinamizar o seu mundo de negócios e acredito também para se capitalizar, teve uma ideia porque não dizer genial: criar uma moeda. Passava muito café pelo seu sitio, seu rodeiro trabalhava o ano todo, permanecia café de muitos produtores em seus armazéns.
As moedas teriam como referência o café e sua garantia pessoal. Circularia representando o café enquanto este não era pilado ou colhido. Facilitaria muito as transações comerciais, pois como sabemos a colheita do café é anual e o processo de pilagem não é feito com rapidez.
                As moedas teriam três valores faciais: um alqueire (128 litros), uma quarta (32 litros) e uma terça (8 litros), tudo medido em “café em coco”, ou seja, café seco antes de ser pilado. Dito e feito. Quem o procurava para pilar café, entrava na fila da pilagem, deixava o café no Bom Sucesso e levava as moedas.
                  As moedas foram cunhadas em bronze com verso e reverso, talvez em Portugal, talvez na Bahia, todas com a data de 1895.
Passaram a circular em toda a serra e no sertão ao redor. Tiveram muita aceitação, o lastro era em café — que se valorizava a cada dia — e a garantia era de um homem muito conhecido, rico e de bem. Ainda não se tinha ideia de inflação e era mais fácil guardar moedas que sacos de café. E muito importante, facilitava em muito as transações comerciais. Também possuí-las seria mesmo uma poupança! Pela confrontação das datas devem ter tido uma vida útil, dentro da maneira que foram concebidas de uns 20 anos.
                   A borracha perde o seu valor e o coronel ganha dívidas e incertezas.
                   Correm boatos de sua fraqueza financeira e muitos o procuram para “trocar” as moedas por café e infelizmente já não existia café suficiente nos armazéns da Fazenda Bom Sucesso para trocar as moedas. Os credores, possuidores de moedas, começam a exigir que sejam ressarcidos e o coronel passa a honrar seus compromissos com dinheiro de outras fontes.
                 Homem correto  como era o nosso coronel resolve juntar suas moedas para não ter seu nome sujo já que seus negócios fraquejavam cada vez mais. Tinha medo da posteridade. Toma então uma grave decisão: vender terras para se capitalizar e saldar suas dívidas, honrar e reaver as moedas que tinham seu nome.
               Após juntar as moedas, com certeza todas que lhe foram apresentadas, saldar os compromissos assumidos, já sem forças e de finanças bem corroídas, dirige-se ao amigo Aprígio Alves Barreira Cravo no sítio Pau d’Alho em Pacoti; neste encontro presenciado por meu tio avô José Nepomuceno, o querido José Chicó, meu ídolo, que era administrador do Pau d’Alho à época, o velho Manoel apresenta e presenteia as moedas já sem valor ao amigo Aprígio, recorda-se de sua longa vida de luta, brama sua honra e volta ao Bom Sucesso.
               Fora sua última parada. Em seguida põe fim a sua própria vida.